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Encontramos, na rede mundial de computadores, um interessante artigo escrito pelo Professor Hudson Hübner França (que foi um dos nossos mestres da Disciplina de Cardiologia) acerca do simbolismo da cerimônia da colação de grau.
Vale a pena ler esse trabalho:
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RITO DE COLAÇÃO DE GRAU
Hudson Hübner França
Retirado do Suplemento Cultural APM Maio/2001
Na idade média, época em que foram criadas as Universidades, as procissões eram acontecimentos comuns nos centros urbanos.
Freqüentes, tinham papel proeminente nas ocasiões festivas ou expiratórias.
As procissões aconteciam nos dias destinados às grandes celebrações: um feito de guerra, o louvor ao santo padroeiro, como prece coletiva para se evitar a peste ou outras calamidades, como homenagem a um grande dignitário.
O povo, os governantes, as figuras importantes desfilavam pelas ruas da cidade, ordenadamente, em alas. Era a ocasião em que as pessoas ilustres se mostravam à população com suas roupas mais vistosas e, nesse cortejo, eram levadas e mostradas ao povo as insígnias e relíquias, em meio a bandeiras e estandartes que relacionavam a comemoração.
A colação de grau é um momento na vida importante na vida acadêmica. Por isso, nada mais justo que se inicie e termine a sua cerimônia com uma procissão, reproduzindo, assim, uma tradição de 800 anos.
Esta reunião da Congregação de Professores da Faculdade de Ciências Médicas de Sorocaba, que é pública e festiva, foi convocada, explicitamente, para conferir o grau de médico aos alunos que concluíram o curso de medicina.
A colação de grau, regimentalmente, pode ser feita na secretaria da Faculdade, com a presença do formando, seu Diretor e certo número de professores.
Por que, então, esta reunião pública, festiva, revestida de pompa e cerimônia?
Isto porque a cerimônia, o ritual, tem função antropológica de marcar os acontecimentos notáveis.
Por isso, nos tempos antigos, todo fato significante era celebrado com ritual; assim, a semeadura do campo e a colheita eram comemoradas com grandes festas, repletas de significados.
Nos tempos modernos, os rituais foram deixados de lado e o seu significado, aos poucos, se perdeu.
Mas, é preciso que alguns rituais existam; é preciso que haja a cerimônia para que o homem identifique, na sua vida, aquilo que, realmente, tem valor.
Ser médico não é possível a muitos.
Ser médico é um privilégio de poucos.
Primeiro há um chamado, a vocação. Depois, é necessário possuir o Dom. Em seguida, é preciso ter condições intelectuais e financeiras para enfrentar um curso difícil, longo e caro.
É preciso disposição para suportar longas horas de estudo, dias e noites de trabalho e treinamento; é preciso estar disposto a conviver com o cansaço, o sofrimento e a morte.
Por isso, receber o diploma de médico é um fato enorme significância para todos nós e merece ser marcado por uma cerimônia, por rituais.
A colação de grau é um rito de passagem, um rito de iniciação.
É o momento em que o iniciado deixa o mundo velho para entrar em outro, totalmente novo. Deixa o universo em que era tutelado e penetra em outro, diferente, repleto de surpresas, expectativas, decisões, pelas quais é totalmente responsável a partir de agora.
Neste momento, é preciso alguém mais velho, mais experiente, para recebê-lo, para conduzi-lo nessa passagem, para introduzi-lo neste mundo diverso e apor a chancela que declara estar ele apto para as novas funções.
Para isso é que estamos aqui, nesta solenidade pública, festiva, repleta de significados.
Colar grau significa conceder a alguém um título acadêmico. Nesta cerimônia, será concedido o grau de médico aos que concluíram o curso, revivendo tradições de 9 séculos.
As universidades nasceram na Idade Média, particularmente nos séculos XII e XIII.
Nessa época, as universidades eram ligadas intimamente à igreja. De um modo ou de outro, seus professores, alunos e funcionários estavam relacionados com a igreja e, em geral, usavam o vestuário próprio dos clérigos. O vestuário que nós usamos hoje relembra o daquele tempo.
A beca, traje habitual nas colações de grau, é uma reprodução da roupa clerical daquela época: túnica longa, preta, hábito talar usado, comumente, nas primeiras universidades.
O capelo capa curta, provida de capuz, jogado sobre os ombros, fazia parte do vestuário dos doutores da universidade medieval.
Por analogia, é usado, hoje, pelos professores universitários, em certos atos e funções acadêmicos.
Fazem parte do cerimonial da colação de grau, algumas insígnias que são repletas de simbolismo.
Além do juramento coletivo, cada formando, presta juramento individual frente ao Diretor da Faculdade.
Com a mão direita sobre a Bíblia, promete exercer a profissão de acordo com os padrões éticos e científicos exigidos. O Diretor da Faculdade coloca, então, sobre a sua cabeça o barrete doutoral — a borla — e confere-lhe o grau de médico.
A Bíblia, o livro sagrado das civilizações cristãs, é usada, em nosso meio, como depositária desse juramento.
Fora isso, como livro, a Bíblia tem outro significado nesta solenidade. Fechado, o livro simboliza a ciência, o conhecimento que o médico deve ter, aberto, mostra a sua disponibilidade para ensinar e aconselhar a todos que eles precisarem.
A borla é barrete do qual pendem fios e cordões se seda, lã, ouro ou prata. É colocada, na cabeça do doutorando enquanto pronuncia seu juramento e recebe o grau de médico.
A borla é o símbolo da dignidade, da distinção, do doutoramento.
O anel simboliza o compromisso do homem com a sua profissão; é o sinal da finalidade ao juramento proferido, de uma ligação profunda e permanente que torna inseparável a pessoa da profissão que escolheu.
O verde é a cor distintiva da medicina. A esmeralda é a pedra símbolo da profissão. Nos tempos medievais, a esmeralda era vista como tendo poderes benéficos de cura, de clarividência, de fertilidade e imortalidade.
A esmeralda é a uma expressão da renovação periódica da natureza; é símbolo da primavera, da evolução e da vida.
Os médicos, em geral, mesmo que não tenham o grau acadêmico de doutor, são tratados como tal. Esse tratamento é concedido, também, aos advogados, magistrados e teólogos.
Isso tem uma explicação, uma motivação histórica.
A palavra “doutor” significa “aquele que ensina” – Provém do verbo latino “docere”, que quer dizer ensinar (a mesma raiz do docente).
O médico é tratado por doutor por que, sua função primeira, principal, não é curar doenças, mas, sim, ensinar a comunidade o que fazer para evitá-las; seu papel mais importante é ensinar hábitos higiênicos e comportamento saudável com a finalidade de preservar a saúde. É a função de professor, de ensinar, inerente à profissão médica.
Daí, os médicos serem chamados de doutores.
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